20 de outubro de 2018

REALIDADE PRISIONAL


A VIDA CRISTÃ E A REALIDADE DAS PRISÕES


Nunca defenda a prisão como se fosse positiva; como se fosse um remédio para a criminalidade; como se sanasse a violência. Um dia você poderá ser vítima dela, se não você, mas alguém de sua família. Não pense como os outros, ou pela cabeça dos outros. Na verdade, a prisão foi pensada para fazer com que a pessoa se recolhesse, refletisse e procurasse repensar a sua vida, mas, para isso, ela deveria ser assistida, ajudada, tratada como gente, para se reorganizar na vida. Nada disso, em hipótese alguma, acontece.
Tudo na prisão está relacionado a morte. Infeliz da pessoa que é condenada pela justiça a ir para a prisão. Lá ela deveria perder apenas a liberdade, e nunca a sua condição de pessoa humana, mas ao contrário, ela perde não só a condição humana como a própria vida.
Um período, por pequeno que seja, marca de forma negativa, e, curioso, não importa o tamanho da cadeia, a prisão tem as mesmas características. Onde estão 16 presos em celas separadas, só existe uma hora de banho de sol para cada cela. Poderia ser completamente diferente, mas os mesmos padrões são mantidos. Uma cadeia desse porte infringe a lei, como se faz num presídio que retira o banho de sol. Por lei duas horas, pela lei da cadeia, ou de quem está no plantão, uma hora ou nenhuma.
Em presídios grandes tem televisão, cantina, celas mais organizadas, e individualizadas, para quem tem dinheiro. Se tem cantina dentro da prisão é porque tem quem compre e deixe de lado a comida oferecida. Numa cadeia com 18 pessoas não pode haver um rádio nem uma televisão. O isolamento é total, nenhuma atividade.
Para uma pessoa refazer a vida na prisão é preciso assistência religiosa e psicológica; necessita-se de escola, leitura e alguma ocupação, enfim... Quem cuida da prisão não pode pensar apenas em segurança, como de modo geral está organizada a unidade prisional. O agente não é uma pessoa próxima que atende, salvas as exceções.
A condenação não é simplesmente a sentença, como deveria ser, mas um conjunto infinito de sofrimentos como castigo pelo suposto delito, que em muitos casos não aconteceu ou aconteceu fora dos parâmetros da condenação que está em jogo.
A prisão é um dos maiores males implantados na sociedade. Ela é fonte de violência, de morte, de desvio de recursos. É um dinheiro perdido. É como o dinheiro que judas recebeu pela morte de Jesus. Gasta-se na prisão para favorecer a morte de milhares de pessoas, as detidas e seus familiares. A prisão é a degradação da vida humana. Os que passam pelas grades, mesmo fora delas, continuam aprisionados, rotulados, estigmatizados para o resto da vida. Como ser a favor de uma estrutura que apenas mata fisicamente, psicologicamente, socialmente e culturalmente?
Que adianta ter avanços em tantas áreas de atuação se estamos neste estágio degradante no sistema carcerário brasileiro, se a questão é muito mais grave em muitos lugares do que no tempo da escravidão?  Como aceitar essa situação se a obra prima da criação é tratada de forma mais degradante que as outras criaturas?
Deus não está presente em nenhum tribunal que condena o ser humano a essa situação; Deus não está presente em nenhum templo religioso que esteja a favor da conjuntura prisional brasileira, por mais belo que seja o culto. A vida humana é tão sagrada como o culto. Comemos a carne de Cristo no culto para tocá-la, curá-la no irmão que sofre em toda e qualquer forma de prisão. Fomos libertados por Cristo para vivermos livres (Gálatas 5,1). Como podemos escravizar uns aos outros, por um julgamento injusto que não leva em conta a vida e a história de cada pessoa?
Como conseguimos separar a nossa vida dos nossos cultos? Como rezamos, fazemos as bonitas liturgias no domingo se não semana usamos da tirania ou concordamos com ela? Como fazer apologia ao crime defendendo as duras punições, os tratamentos cruéis e desumanos nas prisões? Até quando os cristãos vão separar fé e vida? Até quando nós, os tidos religiosos, vamos carregar esse dualismo, reduzindo a presença de Cristo aos templos, se somos templos de Deus?
Nosso culto pode estar vazio, desagradando ao próprio Deus, como está escrito no profeta Isaias capitulo 1: “Eu não quero todos esses sacrifícios que vocês me oferecem. Estou farto de bodes e de animais gordos queimados no altar; estou enjoado do sangue de touros novos, não quero mais carneiros nem cabritos. Precisamos do culto que agrade ao Senhor e cada vez mais nos aproxime dele através da nossa proximidade com as pessoas excluídas.
Por isso o sonho de Deus é um mundo sem prisão alguma. Deus não nos criou para as algemas mas para a vida paradisíaca.

Pe Bosco